Marina Silva é ofendida por parlamentares, tem microfone cortado e se retira de sessão no Senado


O senador Marcos Rogério, do PL, presidente da Comissão, disse que Marina Silva deveria “se por no seu lugar”. E o senador Plínio Valério, do SB, afirmou que respeitava a mulher, mas não a ministra. Marina Silva é ofendida por parlamentares durante sessão no Senado
Reprodução/TV Globo
Parlamentares ofenderam nesta terça-feira (27) a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, na Comissão de Infraestrutura do Senado. O debate era sobre a proteção ambiental na Amazônia. Em determinado momento, o senador Marcos Rogério, do PL, presidente da Comissão, disse que Marina Silva deveria “se por no seu lugar”. E o senador Plínio Valério, do SB, afirmou que respeitava a mulher, mas não a ministra.
Marina reagiu, cobrou pedido de desculpas, que não veio. Ela então decidiu se retirar da audiência.
Marina Silva participava de uma audiência sobre a criação de unidades de conservação no Amapá, na região da bacia do Rio Amazonas. Mas surgiram outros assuntos que geraram discussão. O senador Omar Aziz, do PSD, falou sobre o projeto de asfaltamento da BR-319, que liga Manaus a Porto Velho.
“Queremos, sim! Nós temos o direito de passear na BR-319, e não é a senhora que não vai permitir que a gente passeie na BR-319. Nós, amazonenses, queremos ter o direito de passear na BR-319. A senhora passeia na Avenida Paulista hoje, e nós queremos passear na BR-319”, afirmou o senador, Omar Aziz.
A ministra defendeu que é necessário antes uma “avaliação ambiental estratégica”.
“Eu digo para Vossa Excelência, com toda a tranquilidade da alma, que isso tem uma mistura de técnica e de ética, porque eu não faço o meu trabalho pensando nas próximas eleições. Eu faço o meu trabalho com base naquilo que é a lei e nas futuras gerações”, disse Marina Silva.
Omar Aziz: A senhora não é mais ética do que ninguém aqui.
Marina Silva: Eu sei que eu não sou.
Omar Aziz: Não é não.
Marina Silva: Eu não disse que eu não sou…
Omar Aziz: Não venha mensurar ética para mim porque a senhora não tem esse direito. Ético eu também sou.
Marina Silva: Mas eu não estou dizendo…
Aziz disse que Marina atrapalha o desenvolvimento do país.
“Eu lhe digo isso com a maior naturalidade do mundo. A senhora atrapalha o desenvolvimento do nosso país. Tem mais de 5 mil obras paradas por causa dessa conversinha, governança, nhem-nhem-nhem, blá-blá-blá”.
O senador falava. A ministra tentava responder, e o presidente da sessão, senador Marcos Rogério, do PL, também a interrompeu.
“Que eu possa falar por pelo menos um minuto, porque eu estou aqui como convidada”, disse Marina.
“Ministra, Vossa Excelência está como convidada, mas não está aqui presidindo a sessão”, afirmou Marcos Rogério.
“Não estou presidindo, mas eu não fui convidada para que as pessoas…”, rebateu Marina.
O microfone dela foi cortado mais uma vez pelo senador Marcos Rogério. A ministra do Meio Ambiente disse que se sentiu ofendida pelas falas do senador Omar Aziz. E o presidente da sessão resolveu questionar a afirmação com os demais senadores.
“Vossa Excelência disse que o senador Omar está te ofendendo. Eu consulto os senadores se o Omar Aziz ofendeu a ministra em algum momento. Falou comigo aqui ao lado. Então, vou assegurar a palavra aos demais senadores. Se Vossa Excelência quiser um minuto… Ele não lhe fez nenhuma pergunta”.
Marcos Rogério tentou passar a palavra para o próximo orador.
“Com a palavra, Chico Rodrigues… Chico Rodrigues tem a palavra…”.
O bate-boca recomeçou. O presidente da comissão então falou sobre o comportamento de Marina. E ela disse que não é uma mulher submissa.
“Essa é a educação da ministra Marina Silva”, disse Marcos Rogério.
“Não. Eu tenho educação, sim”, retrucou Marina.
“Ela aponta o dedo. Senador Chico Rodrigues. Mas não eu não vou intimidar, não”, falou Marcos Rogério.
“O senhor não se importaria se eu fosse uma mulher submissa. Eu não sou, não”, respondeu Marina.
Marcos Rogério então olhou para a ministra e disse:
“Agora sexismo, ministra. Com todo o respeito, ministra”.
Marina: O senhor gostaria que eu fosse. Não sou, não sou. Eu vou falar.
Marcos Rogério: Me respeite, ministra, me respeite.
Marina: Eu estou lhe respeitando. O senhor que tem que falar comigo, sinceramente.
Marcos Rogério: Me respeite, ministra, se ponha no teu lugar.
A senadora Eliziane Gama, do PSD, reagiu.
“Que isso, presidente? Que isso! Que desrespeito é esse com a ministra?”.
O senador Plínio Valério, do PSDB, tomou a palavra. Em março, em evento no Amazonas, ele disse: “Imaginem o que é ficar com a Marina seis horas e dez minutos sem ter vontade de enforcá-la.”
“Ministra Marina, que bom reencontrá-la! E, ao olhar para a senhora, eu estou vendo a ministra. Eu não estou falando com a mulher. Eu estou falando com a ministra”.
Mesmo com o microfone desligado, Marina respondeu:
“O senhor está falando com as duas coisas”.
Plínio Valério: Não, não. Eu estou falando com a ministra.
Marina Silva: O senhor está falando com as duas coisas, que o senhor disse…
Plínio Valério: Porque a mulher merece respeito e a ministra, não. Por isso que eu quero separar.
Marina Silva: O senhor que disse que queria me enforcar.
O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho, saiu em defesa de Marina e sugeriu que ela poderia deixar a sessão.
“O debate político pode ser caloroso, pode sim expressar divergências, agora manifestação de desrespeito é inaceitável. Quando alguém começa um debate dizendo que respeita a mulher, mas não respeita a ministra, isso não cabe num debate institucional”, afirmou o senador Rogério Carvalho.
Marina exigiu desculpas de Plínio Valério.
Marina: O senhor me peça desculpas e eu permaneço. Se não pede desculpas, vou me retirar.
Marcos Rogério: Se Vossa Excelência quiser se retirar, pode se retirar.
Marina: Não, eles me convidaram como ministra.
Plínio: Não vou pedir desculpas. Quando separei é porque não tenho nada como a mulher ministra.
A ministra se levantou e saiu da sala. Antes de ir embora, ainda é possível ouvir Marina dizer uma frase:
“Se vocês me convidaram como ministra, tem que me respeitar. Ou eu me retiro. Porque não fui convidada por ser mulher”.
Depois da sessão, a ministra Marina Silva se reuniu com o presidente da Câmara, Hugo Motta, do Republicanos, para pedir mais debates sobre o projeto que muda as regras do licenciamento ambiental. O texto já foi aprovado no Senado.
Antes de deixar o Congresso, Marina disse que se sentiu agredida na sessão.
“Com certeza isso acontece com a gente o tempo todo. Eu sei a gente para criar sonoridade entre nós. Porque vocês no governo anterior, muitas jornalistas também foram agredidas fazendo o seu trabalho. E eu me senti agredida fazendo o meu trabalho. A gente tem sempre que avaliar aquilo que é o nosso direito e não abrir mão do nosso direito”.
Depois, em entrevista à Globonews, a ministra voltou a falar da sessão.
“Eu saí dali, posso te dizer, mais fortalecida. Eles não conseguiram me intimidar. Não tem como intimidar quem tem uma causa. É que as pessoas adoram ter um bode expiatório. Agora, quando esse bode expiatório é uma mulher, é uma mulher preta, é uma mulher de origem humilde e que tem convicção e que ninguém vai dizer, nem um senador nem ninguém, qual o meu lugar. O meu lugar é defendendo aquilo que eu acredito. O meu lugar trabalhando para combater desigualdade, ter um modelo de desenvolvimento que gere prosperidade”.
Procurado, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, do União Brasil, não quis comentar o episódio.
Em nota, o senador Marcos Rogério afirmou que repudia a exploração, que chamou de abjeta e maldosa, alimentada, inclusive, pelo vitimismo de quem, na condição de ministra de Estado, não respeitou o ambiente da comissão.
Ministros do governo publicaram mensagens se solidarizando com a ministra Marina Silva.
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