Como a Petrobras avança na extração de petróleo na Foz do Amazonas

Petrobras tenta conseguir licença de perfuração para região na Foz do AmazonasNádia Pontes

Nádia Pontes

O plano de emergência elaborado pela Petrobras para resguardar a Bacia Marítima do Amazonas em caso de vazamento de petróleo foi aprovado.

O parecer do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) divulgado na noite desta segunda-feira (19/05), era aguardado desde o início do ano.

Chamado formalmente de Plano de Proteção à Fauna (PPAF), o planejamento detalha o passo a passo que a empresa seguirá em caso de acidente.

Esta etapa faz parte do processo de licenciamento ambiental para perfurar o poço FZA-M-59, zona influenciada por uma das correntes marítimas mais fortes do globo e de alta sensibilidade socioambiental.

Segundo o novo parecer do Ibama, ao qual a DW teve acesso, “importantes aprimoramentos foram incorporados” ao último PPAF, reencaminhado pela Petrobras em novembro de 2024. O pedido havia sido negado em 2023, mas a empresa entrou com um recurso e o Ibama, de forma inédita, ofereceu uma nova chance.

“Diante das ponderações apresentadas (…) entende-se como alternativa plausível considerar o Plano de Proteção e Atendimento à Fauna Oleada – PPAF conceitualmente aprovado, sendo necessário, para aprovação final do Plano de Emergência Individual – PEI, a realização bem-sucedida de uma Avaliação Pré-Operacional”, conclui o documento oficial.

Frustração e desconfiança

Para muitos que acompanham de perto o processo na Bacia Marítima da Foz do Amazonas, que avança e retrocede desde 2014, o resultado é frustrante. Em fevereiro, a equipe técnica do Ibama havia sugerido que a presidência do órgão mantivesse a negativa ao pedido da Petrobras, alegando que o plano não previa resgate de inúmeros grupos e espécies da megafauna – incluindo aquelas ameaçadas de extinção.

“Os problemas são os mesmos. Agora vai depender de como a avaliação pré-operacional no local vai se desenrolar, o que pode ser influenciado por diversos fatores, desde as condições ambientais até limitações orçamentárias para viabilizar o acompanhamento pelo Ibama”, diz à DW Leandro Valentim, servidor do Ibama e diretor-adjunto da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema).

Para alguns servidores de carreira ouvidos pela DW na condição de anonimato, a manifestação técnica da coordenação geral do Ibama parece ter sido escrita pela própria Petrobras.

Nas redes sociais, a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, comemorou nesta terça-feira a resposta positiva do Ibama.

Ela disse que a empresa está empenhada em “demonstrar que o que está previsto para essa perfuração é o maior plano de emergência individual já visto para águas profundas e ultraprofundas”.

Num ato falho, Chambriard compartilhou a nota oficial do Ibama, chamando o texto de “nosso comunicado à imprensa”.

O que foi resolvido

A lei brasileira exige a apresentação de um plano de emergência das empresas mesmo que o licenciamento esteja na fase de estudo de viabilidade, como é o caso do bloco 59.

Este plano deve detalhar tudo o que será feito e quais setores são responsáveis pelas ações a serem desencadeadas imediatamente após um incidente. Isso inclui recursos humanos, materiais e equipamentos para prevenção, controle e combate à poluição das águas.

O novo PPAF da Petrobras prevê a construção de um centro de fauna em Oiapoque, Amapá, para receber animais resgatados em caso de vazamento. O transporte da região afetada até essa base levaria entre 10 e 12 horas, segundo o plano, prazo dentro do manual de boas práticas, que estipula como aceitável o tempo máximo de 24 horas.

Uma outra unidade, em Vila Velha do Cassiporé, no Amapá, também foi incorporada ao PPAF. Lá, diversas embarcações de monitoramento e resgate, com possibilidade de transporte aéreo a partir da sonda de perfuração, devem ficar à disposição.

No plano anterior, a principal rota de resgate proposta pela empresa era até o porto de Belém, Pará, com deslocamento previsto entre 22 e 31 horas – com embarcação rápida.

Especialistas ouvidos pela DW ressaltam que a região cobiçada pelas petroleiras, também chamada de Margem Equatorial, é de difícil acesso e não oferece infraestrutura e recursos normalmente disponíveis em zonas onde a extração de petróleo já está consolidada.

Nesta parte da costa da Amazônia existem ainda particularidades que não se aproximam de nenhuma outra bacia produtora do combustível fóssil no país. Isso inclui a presença de povos indígenas, o maior mangue contínuo do mundo e o Grande Sistema de Recifes do Amazonas (GARS), revelado por cientistas brasileiros em 2018.

O próximo passo: o simulado

Com o conceito aprovado, a empresa agora precisa demonstrar, na prática, que o plano de resgate descrito no papel é executável. É a chamada Avaliação Pré-Operacional (APO), uma espécie de “teste” que simula um evento real.

O cenário da APO deve ser criado pelos técnicos do Ibama e deve ser apresentado à Petrobras no dia do teste. O exercício deve focar nas principais dúvidas do plano de emergência apresentado. A data será acordada entre todas as partes, já que o teste exige o deslocamento da sonda prevista para a perfuração, entre outros recursos, e tem que acontecer na região do bloco 59.

“Se de fato a gente conseguir desenhar um exercício bom, e a Petrobras se sair bem, as dúvidas que a gente tem meio que caem por Terra, embora seja um evento só, que não representa a totalidade de diversidade e de possibilidades que têm lá”, explica Valentim.

Um dos cenários possíveis, por exemplo, seria a explosão da sonda e o vazamento do petróleo que estava no reservatório. Depois que a situação hipotética é apresentada, a empresa deve reagir para conter a crise e atualizar o órgão ambiental com as informações – que mudam de acordo com a evolução do exercício, como por exemplo, o deslocamento da mancha de óleo no mar, a presença de aves no local afetado, etc.

Essa avaliação operacional ocorre sempre que um empreendimento busca licença para operar numa região sensível, como é o caso da Foz do Amazonas. A última foi no ano passado, nas águas ultraprofundas da Bacia Potiguar, na costa do Rio Grande do Norte e Ceará.

Caso a Petrobras passe no teste e receba a autorização para perfurar o bloco 59 e sua viabilidade econômica seja atestada, a petroleira precisa submeter um novo pedido de licença para explorar comercialmente o petróleo.

Ainda não há data prevista para que o APO na Margem Equatorial aconteça. “O sentimento geral da equipe é que, mesmo se o exercício não der certo, vai ser muito difícil o Agostinho negar a licença. Provavelmente vai pedir para fazer de novo, ou, com o precedente da decisão de agora, encontrar saídas para aprovar mesmo com a indicação contrária”, lamenta Valentim, referindo-se ao presidente do Ibama.

Autor: Nádia Pontes

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