
O conclave que irá eleger o novo papa começa nesta quarta-feira (7), com a participação de 113 cardeais de diferentes partes do mundo. Isolados na Capela Sistina, eles têm agora a missão de escolher aquele que dará continuidade à liderança dos católicos após o pontificado de Francisco, marcado pela atenção aos mais vulneráveis, à ecologia e à busca por uma Igreja mais acolhedora.
O mundo todo acompanha com atenção esse momento decisivo, e no Brasil não poderia ser diferente. Isso porque o país é o maior reduto de católicos do planeta, segundo o Annuario Pontificio 2025: com 182 milhões de fiéis, temos aqui o equivalente a 13% do total mundial. Com tantos olhos voltados para o futuro da Igreja, cresce também a expectativa dos brasileiros, representados por sete cardeais na eleição do novo papa.
Mas como a Igreja Católica do Brasil enxerga esse momento? O Portal iG conversou com dois religiosos sobre o que se espera desse conclave, quais são os desafios enfrentados pela religião no país e qual o perfil esperado do próximo papa.
“O papa é o elo que une toda a Igreja”, explica bispo de São Carlos
Antes de mais nada: o que faz o papa? Autoridade máxima da Igreja e do Vaticano, a tradição cristã o considera o sucessor de Pedro, aquele a quem Jesus confiou a missão de apascentar a Igreja. É o que explica o bispo Dom Luís Carlos, da diocese de São Carlos (SP).
“Ele é o bispo de Roma. O papa tem uma função importantíssima, porque é aquele a quem foi designada a função de contribuir para a unidade de toda a Igreja Católica, que está espalhada por todo o mundo. Como um farol”, diz.
Essa missão também inclui manter a Igreja conectada com a realidade global. Por meio da Santa Sé, órgão responsável pela organização interna do catolicismo, o papa é munido com informações de todos os cantos do mundo por meio de encontros com bispos, representantes e especialistas de diversas regiões.
Ele explica que essa escuta acontece de forma sistemática, o que faz com que o papa ocupe um lugar privilegiado na compreensão do mundo. “Ninguém conhece esse globo mais do que o papa. É alguém que está em um estágio superior de conhecimento. Não por ele mesmo, por ser muito inteligente, mas por esse processo de receber”, diz D. Luís.
É por isso que o pontífice também é visto como ponto de articulação política global, o que pode pesar na sua escolha. Nos dias que antecedem o conclave, os cardeais se reúnem compartilhar as urgências de suas regiões e, com isso, “surge uma análise de conjuntura por essas falas, tanto do ponto de vista mundial, quanto do ponto de vista eclesial. Essas falas vão moldando também o perfil do novo papa, com base nas necessidades apontadas pelos cardeais”, explica o bispo.
Um novo Papa, mas um caminho sem volta
Ambos os religiosos entrevistados compartilham da mesma visão: o legado do papa Francisco deu início a uma nova era do catolicismo. E esse novo capítulo pode pesar nas expectativas e na missão do sucessor.
“Eu penso que alguns temas não retrocedem com a mudança do papa”, afirma o padre Luiz Fernando. “Não esperamos uma cópia do papa Francisco. Cada papa tem sua personalidade, seu modo de ser. Mas a continuidade em temas importantes é essencial”, diz.
Para ele, há quatro grandes eixos que deveriam orientar o perfil do novo pontífice: a sinodalidade, que é a capacidade de construir projetos pastorais em conjunto com as igrejas locais, a atenção à justiça social, o compromisso com a ecologia integral e a transparência na gestão.
O bispo Dom Luís também acredita que o estilo de Francisco molda inevitavelmente o conclave. “Não tem como ignorar o legado dele”, diz. Ele cita a “Igreja em saída”, missionária, como uma das marcas do pontificado. Para ele, esse espírito de missão e de abertura deve continuar.
“O papa Francisco foi fundamental para recolocar o ser humano no centro, para lembrar que a Igreja deve nos regenerar com o amor e o perdão de Deus”, afirma. “Ele trouxe de volta o humano, como diz o Evangelho, para o foco das nossas preocupações, acima de qualquer questão política e desse sistema que prioriza o lucro. Não tem como a Igreja recuar disso”, ressalta.
O que o Brasil espera do conclave?
Se o papa é a figura de unidade para toda a Igreja, essa missão inclui também a escuta das mais de 270 dioceses brasileiras, que compõem uma das maiores conferências episcopais do mundo. É o que explica o padre Luiz Fernando, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
“Temos dioceses nos interiores, nos grandes centros urbanos, na região amazônica. Cada uma com suas particularidades, desafios e modos de se relacionar com a comunidade local”, explica o religioso.
Em comum, porém, ele aponta a preocupação com questões sociais urgentes no país, como as desigualdades históricas, o aumento da polarização política e o desafio de evangelizar nas cidades. Também se destaca, impulsionada pelo pontificado de Francisco, a pauta ambiental. “Quando falamos de ecologia integral, não falamos só de preservação do meio ambiente, mas da vida na totalidade. Toda a vida é ameaçada, então toda a vida precisa ser preservada”, diz o pároco.
Afinal, quem será o novo papa?
Apesar das especulações que correm nos noticiários, os religiosos ouvidos pelo iG afirmam que a escolha do novo papa não é tratada internamente como um processo político. Nenhum dos dois quis indicar nomes, mas ambos destacaram a importância das orações da Igreja do Brasil neste momento de transição.

“Eu não conseguiria dizer um nome que circula na Igreja brasileira, porque a Igreja é muito ampla no Brasil. Somos um episcopado com mais de 500 bispos”, diz o padre Luiz Fernando. “Os cardeais que votam estão em um número menor, mas esse tipo de fala, sobre nomes, nós não ouvimos deles. É um conclave com uma pluralidade de perfis. Temos muitos cardeais capacitados, com experiência, e creio que, por serem homens de oração e de visão eclesial, vão conseguir, após bastante diálogo, chegar a um nome que represente o que a Igreja precisa neste momento”, prossegue o religioso.
Dom Luís Carlos, por sua vez, destacou que o momento do conclave é de recolhimento, discernimento e, sobretudo, de observação silenciosa entre os próprios cardeais. “Eles estarão isolados. Lá não tem celular, não tem computador. E aí começa um processo quase natural: eles começam a se olhar um para o outro, né? Porque o papa vai ter que sair dali. Então começa esse movimento, esse clima, e por isso é difícil apontar nomes”.
Quando questionado sobre os nomes apontados na imprensa internacional, o bispo fez questão de lembrar a máxima: “quem entra papável, sai cardeal”. “Bergoglio [o papa Francisco] era citado, sim, mas não era o principal nome. Então podemos ter surpresas. Isso mostra que é um processo muito mais espiritual do que político”, diz.
Padre Luiz Fernando reforça que, pelo menos na Igreja do Brasil, não existe uma articulação. “O que toda Igreja faz é orar nas intenções do conclave, pedindo o Espírito Santo para que Ele ilumine o novo papa. Certamente, o Brasil tem sua representação por meio dos sete cardeais que estarão presentes, então surge esse espírito de comunhão. Esses sete brasileiros estarão em comunhão com toda a Igreja no Brasil, e todo o país estará em comunhão com eles”, conclui.