Edith Piaf, uma Justa entre as Nações

Retrato de Edith Piaf com prisioneiros franceses: a imagem permitiu a produção de passaportes falsos para a fuga da AlemanhaReprodução

Nesta semana, encontrei mais um motivo para amar Edith Piaf em uma reportagem publicada no portal israelense Yediot Achronot: um dossiê apresentado ao Yad Vashem, o Museu do Holocausto de Jerusalém, comprovou o enorme esforço e risco enfrentados pela icônica artista francesa em conjunto com sua assistente, Andrée Bigard, e a condessa Lily Pastré durante a Segunda Guerra Mundial. O que as três fizeram para salvar judeus franceses – principalmente amigos e conhecidos do mundo artístico – renderia um roteiro digno de Hollywood. Entre outras ações, forjaram documentos falsos de identidade para ajudá-los a escapar do país então ocupado pelos nazistas e também esconderam judeus dentro de suas casas.

Vista externa do Museu do Holocausto de JerusalémReprodução

A casa da condessa, uma villa no sul da França, foi transformada em um santuário para músicos judeus, que ali se esconderam dos perseguidores nazistas por longos períodos. Outra história especialmente audaciosa foi protagonizada por Edith Piaf, que aceitou um convite das autoridades nazistas para se apresentar em um campo de prisioneiros franceses na Alemanha – desde que pudesse ser fotografada com eles após o show. Esse foi o esquema montado para que a resistência francesa pudesse obter retratos de vários deles, com os quais foram produzidos passaportes falsos que os permitiram fugir da Europa.

Retrato de Edith Piaf com prisioneiros franceses: a imagem permitiu a produção de passaportes falsos para a fuga da AlemanhaReprodução

Honraria em Israel

A reportagem do Yediot focou, na verdade, sobre o esforço de um pesquisador, Meir Bulka, em obter para as três mulheres o título de honra “Justa entre as Nações”. Esta é uma homenagem sensível e de grande valor, concedida pelo Yad Vashem em nome do próprio Estado de Israel. O reconhecimento é dedicado a não judeus que arriscaram suas vidas para salvar judeus durante os anos de governo nazista.

Como descreve o Museu do Holocausto de Curitiba, que colabora na divulgação dessas histórias e valores, são “homens e mulheres, católicos romanos e russos ortodoxos, batistas e luteranos, enfermeiras e babás, colegas e vizinhos, empregados e amigos, que arriscaram suas próprias vidas e as de seus familiares para salvar judeus perseguidos. Destes, 6.454 possuíam nacionalidade polonesa, o maior número entre os Justos, mesmo sendo o único entre os países sob domínio nazista em que qualquer ajuda aos judeus era, pela lei alemã, punível com a morte.”

Entre os quase 27 mil homenageados até hoje, há dois brasileiros: Luiz Martins de Souza Dantas e Aracy de Carvalho Guimarães Rosa, ambos então membros do corpo diplomático brasileiro na Europa, que concederam vistos de entrada no Brasil a judeus contrariando ordens do então presidente Getúlio Vargas. O mais famoso entre eles é o empresário Oskar Schindler, que tornou-se conhecido após ter sido retratado no emocionante filme de Steven Spielberg, A Lista de Schindler. 

Pôster do filme A Lista de SchindlerDivulgação

As histórias protagonizadas por essas pessoas exibem uma coragem e um senso de justiça comoventes. Para quem quiser conhecer mais histórias como essas, o Museu do Holocausto disponibilizou este material educativo: Jan Karski e os Justos entre as Nações (PDF)

Torcendo por Edith

Desde a recomendação até a decisão final, cada nome passa por um longo processo de investigação, e a escolha é feita de acordo com critérios rigorosos. Entre eles, o candidato deve ser necessariamente não judeu, ter arriscado a própria vida para salvar judeus e não ter atuado por interesse pessoal (financeiro ou laços familiares, por exemplo). A indicação também precisa ser confirmada por um testemunho em primeira mão – este é o único item faltante no caso das três mulheres, o que é compreensível uma vez que já se passaram 80 anos desde o fim da guerra.

Agora resta torcer para que o Yad Vashem encontre uma forma de flexibilizar as regras para que Edith, Andrée e Lily sejam devidamente celebradas como Justas entre as Nações. Seja como for, o “hino” de Piaf (No, Je Ne Regrette Rien – Não, eu não me arrependo de nada), ganhou, para mim, um novo significado.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG

 

 

 

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